segunda-feira, 5 de abril de 2010

Burle Marx é Deus?

ou: vale a pena tanta reverência?






















A praça de Casa Forte passará por reformas
com vistas a resgatar o projeto original
do paisagista Burle Marx.

Clique AQUI para ler matéria publicada
no Jornal do Commercio em 21/03/2010.



Até que ponto vale a pena preservar o patrimônio cultural,
quando para isso é necessário fazer intervenções radicais
no patrimônio natural?

O patrimônio cultural, no caso, são os projetos paisagísticos de algumas praças da cidade do Recife elaborados por um dos mais renomados/respeitados paisagistas do Brasil, Roberto Burle Marx.
O arquiteto foi responsável por vários projetos de praças e parques da capital pernambucana, a exemplo da praça de Casa Forte, da praça do Clube Internacional, do Parque de Santana (também em Casa Forte) e do projeto original do Parque Memorial Arcoverde (aquele mesmo que o governo torceu o nariz para a derrubada de dezenas de árvores para a instalação temporária do Cirque du Soleil).

É louvável preservar a memória cultural de uma cidade
e levar aos seus cidadãos/ãs o conhecimento da autoria
das obras com as quais convivemos e interagimos no nosso
dia-a-dia, ainda mais quando temos pessoas ilustres
como responsáveis pelas mesmas.

Quando o patrimônio é uma obra exclusivamente de engenharia,
a recuperação da mesma se dá no âmbito material, na
reconstrução de uma edificação por exemplo. Mas quando
se fala em recuperar projetos paisagísticos "originais" de praças
e parques, de modo a manter os esboços e as indicações
de espécies vegetais indicadas no projeto e com suas localizações
exatas, estamos lidando com seres vivos e com um manejo muito
mais delicado do que o de se substituir ferragens ou as telhas
de um prédio histórico.

Em matéria publicada recentemente no Jornal do Commercio (clique AQUI para ler a matéria), foi divulgado que intervenções serão feitas na Praça de Casa Forte, de modo a manter o projeto original desenvlvido pelo paisagista Burle Marx, assim como foi feito com
o seu projeto para a praça do Clube Internacional, onde temos uma recriação da vegetação do semi-árido do nordeste.

No caso da Praça de casa Forte, as mudanças não seriam tão radicais como foram as da praça do Clube Internacional. Talvez até passem desapercebidas pela maioria da população. Mas no meu entender, o problema é que a referida "reforma", ou restauro, como devem preferir os autores do projeto de intervenção, envolve o transplantio de algumas espécies adultas que, ou nasceram espontaneamente, ou foram plantadas pela própria prefeitura ao longo desses anos que nos distanciam da data do projeto original da praça, que é de 1935, ou seja, há 75 anos atrás.

Segundo a matéria do jornal, o projeto original da praça contempla três setores distintos, nos quais o paisagista distribuiu espécies de origens exóticas (originárias de outros países), nativas (originárias da nossa região) e espécies originárias do amazonas. Mas, com o passar do tempo,
espécies de origens diferentes das dos setores definidos, se misturaram.
Em resumo: árvores nativas ocupam a área das exóticas, enquanto especies amazônicas estão no espaço destinado as nativas e vice-versa. Nada mais natural, afinal, a natureza é dinâmica, independente e transformadora, não se prendendo a projetos saídos de pranchetas e/ou computadores.

Agora querem fazer o transplantio de árvores adultas, uma operação delicada,
cara e sem a garantia de sucesso, transferindo-as de um setor a outro, a poucos metros de distância.
Em um passeio rápido pela praça nesse final de semana de páscoa, pude constatar a presença de pelo menos 5 Felícios/Felicium decipiens adultos (árvore exótica) e uns 2 Sombreiros/Clitoria Fairchildiana (árvore amazônica) na área destinada as árvores nativas, sem falar em uns 3 Flamboyant/Delonix Regia no local destinado as espécies amazônicas. Como relocar árvores com raízes superficiais/terrestes tão extensas como as de um flamboyant sem levá-los à morte? Serriam as árvores bancos de praça, que podem ser movidos de lá pra cá, por capricho de arquitetos?

Não seria mais plausível, preservar e conservar as diversar espécies no local onde estão, homenageando o autor da praça de outras formas?
Por exemplo, criando painéis educativos com reproduções do projeto original, e textos explicando para a população quem foi Burle Marx e o trabalho que ele desenvolveu quando trabalhou nesta cidade, e a importância de se preservar as espécies arbóreas adultas existentes na nossa cidade, independente de serem exóticas ou nativas?

Será que Burle Marx - conhecido pelo seu amor à flora e a natureza - caso estivesse vivo, aprovaria estas intervenções radicais? Quem vai notar essas mudanças, senão seus próprios idealizadores? Será que a população não deveria ser consultada? Será que os moradores da área e usuários da praça em geral, não prefeririam que a prefeitura deixasse as árvores nos seus devidos lugares e investisse na construção de uma pista de cooper e/ou outros equipamentos de lazer, por exemplo?


Clique AQUI para saber quem foi Burle Marx.



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