[ Texto de Isabelle Meunier * ]
Árvores
são seres vivos e requerem, além de respeito, alguns cuidados de manutenção.
Algumas ações implicam em custos, baixos se comparados aos benefícios que esses
seres proporcionam. Mas os maiores custos para a manutenção de uma árvore não
são necessariamente os financeiros, mas os morais e mesmo aqueles referentes
aos danos à saúde física e psicológica... Defender a permanência de uma árvore,
seja em espaço público ou privado, transformou-se em uma luta incessante, um
vai-e-vem em busca de justiça e de apoio, constante vigilância e fonte diuturna
de estresse. Relaxou? O vizinho vai lá e corta um lado da árvore da calçada,
porque as folhas estão sujando o seu (impermeabilizado) jardim; Cochilou? O
condomínio se reúne para decretar a morte de uma árvore porque, apesar de
saudável, ela é grande e vertical e, como tal, pode cair; Distraiu-se? Alguém
poda a árvore em frente, para que não impeça a visão matinal do engarrafamento e
as golfadas de fumaça dos motores.
Três
casos recentes são emblemáticos: uma família luta há mais de 10 anos, com todos
os meios, para manter um belo pinheiro no seu jardim frontal, em Camaragibe,
mesmo com constantes ameaças e denúncias. Com tantas mortes causadas pelo
trânsito, por crimes e drogas, algumas pessoas consideram que a maior ameaça à
vida é a única árvore da rua, que abriga os poucos pássaros e embeleza a
paisagem. Após inúmeras e continuadas batalhas, que envolveram visitas,
pareceres e laudos técnicos, depois de despesas com advogados e muito tempo e
energia gastos, o pinheiro resiste, admirado pelos proprietários e temido pelos
vizinhos....
No
Espinheiro, uma médica mudou sua rotina e mobilizou quem pôde para impedir o
corte de uma árvore da calçada situada onde a construção de um novo prédio
previa a entrada de automóveis, licenciado sem considerar a existência da
árvore. Divulgada pelas redes sociais, a situação comoveu parte mais sensível
da sociedade e provocou a reação do Ministério Público, à custa do empenho e da
abnegação da cidadã, se, garantia, no entanto, da conservação dessa ou de
outras árvores em idêntica condição.
Recentemente,
nas Graças, um condomínio se uniu contra uma palmeira-imperial, pelos motivos
de sempre: ela cresceu demais (como se houvesse outro destino para as
palmeiras, a não ser crescer, majestosa...) e representa um risco. Não se
consegue saber exatamente qual é esse risco prenunciado e a que ele seria devido,
mas os temerosos moradores encontraram eco para seus infundados medos e
conseguiram uma Autorização Ambiental (sim, chama-se assim a autorização para
se suprimir árvores!) da diretoria municipal que deveria zelar pelo meio
ambiente, a despeito do excelente estado sanitário da palmeira. Parece que para os seres urbanos se sentirem
seguro, nada superior a sua estatura deve estar nas suas proximidades, pelo
menos a um raio de 50m. A não ser que sejam torres edificadas pela engenharia,
essas sim, aos seus olhos, seguras, belas e intocáveis.
Se
alguém deseja questionar as denúncias ou as decisões dendrofóbicas, prepare-se
para um périplo kafkiano: há incontáveis números de telefone para esclarecer ou
interceder em prol das árvores que, quando atendem, informam que nada pode ser
feito. Inúmeros órgãos fazem exigências intermináveis, cobram documentos e
registros para, ao final, isentarem-se das suas responsabilidades ou atuarem
nos limites de normas equivocadas e pouco claras. Nos casos citados, ainda um
agravante: as espécies são exóticas! Mais um risco - a de invasão biológica - e
as pobres árvores, cuja origem da espécie em nada impede o fornecimento dos
serviços ambientais, estão desprotegidas legalmente, entregues à
(in)consciência daqueles que, talvez sem se dar conta, contribuem para
inviabilizar a vida na grande cidade.
Defender
a permanência de uma árvore, na Região Metropolitana de Recife, exige tempo,
dinheiro, paciência e quase sempre provoca dores-de-cabeça, angústia e
ansiedade. Ainda assim, é um preço baixo, se conseguirmos, ao menos nesses
casos, fazer com que o bom senso e o respeito à vida prevaleça.
* Isabelle Meunier
é engenheira florestal, professora da UFRPE
ambientalista e eventual colaboradora deste blog.