segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Crônica de uma violência autorizada






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maior.













Texto e fotos por Fabianna Freire Pepeu*
Edição de fotos por Plante Árvores.


Recife - Foi nesta sexta-feira (31-10-2008), que bem poderia ser uma sexta-feira 13e - pra isso - basta alterar a ordem dos números, que o bairro de Boa Viagem ficou ainda mais pobre.Mais pobre porque, afinal, sinal de riqueza não são altos prédios que impedem o vento de circularou o sol de fazer o seu trabalho. Nem muito menos possuir um enorme centro comercial onde se podecomprar de tudo, inclusive o que não se precisa para viver.


O fato é que, ainda zonza com o barulho doloroso e irritante de uma motoserra, me apressei em ligarpara a Brigada Ambiental, que me deu a seguinte informação: se a árvore estivesse num terreno privado, nada poderia ser feito. Era triste, disse a funcionária-ambientalista, mas, pela legislação, apenas em áreas públicas era possível atuar, exceto quando se tratasse de árvores tombadas etc e tal.

De longe, eu não tinha certeza da nada. Mas acreditava que tudo aquilo devia ser coisa das grandes construtoras, que não se cansam de apostar que, um dia, vão finalmente ocupar todos os espaços vazios do mundo e fazer um imóvel que toque no céu.


Desolada, desliguei o telefone e segui para o local do crime:Rua Compositor Ataulfo Alves, uma das poucas silenciosas do bairro de Boa Viagem, provavelmente por ter apenas casas (algumas já transformadas em estabelecimentos comerciais) e ser uma rua sem saída.


No meio do caminho, encontrei um senhor de uns 60 anos, alto, forte e com o uniforme da Prefeitura do Recife, que me disse o seguinte:Alguns moradores chamaram a Empresa Municipal de Limpeza Urbana(Emlurb) porque as árvores estavam ameaçando algumas casas e também em função dos crimes.


Faz sentido fazer uma "poda radical", que é nome que os técnicos utilizamquando o corte é violento, em duas frondosas amendoeiras que coloriam o céu da cidade. Quem precisa de árvores com 30, 40 metros de altura? É necessário reduzir, no mínimo, à metade. E, assim, foi feito.


Árvores são seres perigosos que caem em nossos telhados e derrubam nossas casas. Também são responsáveis - por intermédio de suas folhagens - por darem abrigo a criminosos em fuga.

Quem sou eu para questionar o parecer dos engenheiros da Emlurb? Estudei pouca física, lido apenas com cálculos básicos de matemática, e não conheço a logística de fuga dos criminosos urbanos.


O que sei é que, a cada queda de um pedaço do tronco das amendoeiras,eu sentia uma dor no peito,vontade de chorar e uma grande impotência. Pelo chão, centenas de milhares de folhas, galhos,os frutos da amendoeira,ninhos, restos de sombra.


Daqui, ainda escuto o som da motoserra fragmentando o imenso tronco-mãeda árvore maior. Tudo é colocado num caminhão azul e levado mortopara não-sei-onde. Agora, a luz do dia já se foi e também um bocadoda minha esperança no mundo.

Vejam mais fotos
da poda radical
da Rua Compositor
Ataulfo Alves
clicando nos links
abaixo:

Foto 1: Pra que cortar tanto?
Foto2:
Os pedaços. Será fogueira de festa junina?
Foto3: A motossera



*Fabianna Freire Pepeu é escritora, jornalista
e minha amiga :-)





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